Por Vanessa Sene Cardoso
Você
acha o seu dia a dia monótono, sem graça? Se observá-lo de outra perspectiva,
com uma lente de humor ou ironia, descobrirá que algumas interferências não
previstas na rotina podem render boas histórias e diversão. Aliás, rir de si
mesmo é uma boa prática.
Quero
compartilhar uma história que não é minha, mas acompanhei de perto. A semana,
aparentemente, desastrosa de uma amiga serviu de matéria-prima para essa
crônica.
Sábado de manhã
–
Vamos logo, filho. Temos que colocar a chuteira. Ah! Aqui o seu chocolate com
leite e o pão. Está na hora.
Rafael
tinha um compromisso muito importante, um jogo amistoso de futebol. Estava
empolgadíssimo e preparado para a vitória.
Da
arquibancada vinha a torcida dos pais e da irmã. Vai, Rafael!
Apesar
do incentivo, o placar foi implacável: 1 x 0, 2 x 0, 3 x 0 ... 6 x 0. Mas a mãe
não desistiu. Inspirada nas Olimpíadas - quando os brasileiros abraçaram os
azarões dos Jogos - da arquibancada bradava: “Eu acredito, eu acredito...” Mas
o empenho não inverteu o marcador. Resultado: frustração.
– “Não é justo, mãe. O time deles é
mais velho. Os meninos tem 7 e 8 anos. Eu tenho 6” – lamentava Rafael,
inconformado.
– “Filho, foi apenas um amistoso”.
Assim a mãe tentava consolar o garoto, sem muito sucesso.
Minha amiga prosseguiu na sua
jornada... Tudo vai dar certo.
Sábado
à noite
Agora
é a vez do maridão que foi participar de uma corrida. Todo paramentado seguiu
para o local da prova. Ela e as crianças chegaram cedo para garantir um lugar
perto da pista. E lá estavam grudados na grade, prontos para acompanhar cada
detalhe. De repente vem alguém abrindo caminho, empurrando, pedindo passagem.
Era um idoso com pinta de atleta, e a jovem namorada. Ah! Outro protagonista da
cena foi o celular. Foto daqui, pose dali, selinho pra selfie...
–
“Não acredito no que estou vendo!” - minha amiga nem arriscou transformar o
pensamento em palavras.
O
homem foi passando por todo mundo. Um verdadeiro arrastão, guardadas as devidas
proporções. Seu alvo era pular a grade de proteção. Mas na escalada se deparou
com um obstáculo, a mão do pequeno Rafael, que segurava com entusiasmo a grade
na expectativa de ver o pai passar na pista de corrida. Lá se foi o homem...
Mas sua garota ficou na torcida.
–
“Moça, fala para seu namorado que é muito feio o que ele fez. Ele pisou em uma
criança e nem se deu conta disso” – desabafou minha amiga. Rafael observava o
diálogo com os olhos marejados por causa da dor.
O
evento esportivo transcorreu dentro da normalidade. Quando já estavam indo
embora, perceberam um tumulto. Um integrante do clube de corrida havia passado
mal.
–
“Mãe, é o homem que pisou na mão do Rafael” – afirmou Belinha – Deus me falou
que é ele. Mas como não dava para ver, a mãe desconsiderou.
Mais
tarde...
A
vizinha da minha amiga, que também estava com a família na corrida, disse:
–
“Menina, você não sabe da maior! Presenciamos uma morte depois que vocês foram
embora. O homem que sentiu-se mal foi aquele que passou por nós para pular a
grade de proteção”.
–
“Eu não falei, mãe?!” – lembrou Belinha.
Minha amiga nem podia imaginar que o
sábado começaria com um placar desfavorável e terminaria em morte.
Domingo
de manhã
Dia
de plantão no trabalho. Tendo que atender, simultaneamente, três cursos minha
amiga se vê em apuros. Enquanto dava assistência em uma das salas de aula, as
outras ainda aguardavam a instalação dos equipamentos. Enfim, para uma pessoa
que preza pela organização e o bom atendimento, foi uma provação se deparar com
as coisas fora do planejado.
O
sangue italiano não respeitou “as leis de tráfego das veias”, tal a velocidade
com que ele transitou em poucos segundos da cabeça aos pés, mas minha amiga se
conteve. Que orgulho! Na porta da sala onde seria realizado o curso com maior
público, enquanto recebia os participantes, observava: pessoas e fichas
protocolares se misturavam. Já não dava para saber quem era quem. Burocracia x Acolhimento.
–
“Qual a saída?” – foi a pergunta que dominou a mente de minha amiga, enquanto analisava
a situação.
Aguarde. As coisas podem e vão melhorar! Tenha
fé!
Segunda-feira de manhã no trabalho
–
“...E assim foi meu fim de semana, meninas” – concluiu a exaustiva narrativa.
Assim como a ficção prepara
surpresas para o leitor, a vida real também reserva o inesperado. A saga da
minha amiga estava longe do fim.
Depois de vários dias tentando
adquirir convite para um café da manhã com a participação de conceituado
palestrante, já estava quase desistindo, pois foram muitos os desencontros, finalmente,
obteve sucesso na empreitada. Parece simples, mas fui testemunha de quantas
vezes ela tentou combinar com o organizador uma forma de pegar os convites. Nunca
dava certo! Quase ficou sem o seu exemplar. Ufa! (Depois ela iria descobrir que
poderia ter participado apenas da palestra e, ainda por cima, gratuitamente).
Tem comunicado que a gente recebe e
não sabe do que se trata, principalmente, se somos organizados com nossa vida
civil, financeira e por aí vai.
– “Como bloquearam a sua conta?” –
questionou minha amiga sem entender o que o marido acabara de contar. “Pode ser
o IPTU da minha mãe que está atrasado. Vou à prefeitura verificar” – concluiu.
Lá foi minha amiga tentar descobrir
o que estava acontecendo. Depois de muita conversa, e da sorte de ter sido
atendida por um servidor público que estava ali para “servir o público”mesmo,
conseguiu descobrir a natureza daquela cobrança. Precisou consultar advogado
para resolver uma pendência que nem era pendência de verdade. Como é duro pagar
o que não se deve! Mas no fim tudo dá certo, se não deu certo é porque não
chegou o fim.
Terça-feira
Uma trégua!!!!
Quarta-feira
à tarde
Tudo combinado para a festa surpresa
de uma amiga do trabalho.
–
“Eu vou pegar o salgado e deixar aí por volta de 14h, corro para a prefeitura,
e 16h volto para a festa, combinado?” – programou minha amiga.
É,
a vida é uma caixinha de surpresas.
Em
frente ao computador tentava se concentrar nos documentos que precisava
imprimir. A filha pedindo ajuda para enviar uma mensagem no celular, o filho em
volta distraindo a atenção.
Eis
que surge a funcionária da casa anunciando o aparecimento de uma visita
inesperada.
–
“Para tudo. O que?! Um raaaaato?!”
Não
sabendo o que fazer minha amiga pediu socorro ao marido. Sem se levantar do
sofá, afinal eram os últimos capítulos do impeachment da presidente, disse para
ela recorrer ao porteiro. Mas o funcionário não podia deixar o posto. Primeira
alternativa: sem sucesso.
As
crianças não descuidavam um minuto do intruso que andava com toda desenvoltura
pelo quintal.
–
“Já sei, vou chamar alguém para dedetizar ” – foi a segunda alternativa da
minha amiga para resolver a situação. Quando descobriu o preço do serviço,
desistiu.
A
caçada continuava. E o rato sentindo-se o dono do pedaço... E sobe nas
bicicletas, sobe no carro... Até que, com a ajuda de um vizinho, conseguiram
encurralar o roedor e servir veneno para ele. Por hora o problema estava
resolvido.
Mas
a funcionária da minha amiga levantou uma lebre, que neste caso, era força de
expressão, e não mais um visitante indesejado.
–
“É melhor verificar o carro, pois uma vez entrou um rato em casa e roeu o fio
da minha máquina de costura” – alertou a funcionária.
O
marido da minha amiga desconsiderou essa possibilidade, até que precisou sair e
quando virou a chave na ignição: “pif”. Nem sinal de partida. Mais um
transtorno. Toca chamar a assistência. Pura coincidência. O problema nada tinha
a ver com a excursão do rato pelo interior do carro.
Quinta-feira: Ressaca da semana.
Sexta-feira: Ufa! Que maratona de emoções! Esperança de dias melhores...
...Com
certeza eles virão... As circunstâncias, muitas vezes, são adversas, mas deixar-se
guiar por elas ou não, é uma decisão. Você não tem controle, na maioria das
vezes, e, muito provavelmente, não poderá mudá-las. A sua atitude diante delas,
no entanto, pode fazer toda a diferença.
Um brinde a você, minha Amiga, com
limão, gelo e o que mais a sua imaginação quiser acrescentar.
*Nomes substituídos