domingo, 29 de outubro de 2017

Dando jeito no jeitinho


Por Vanessa Sene Cardoso


Depois de 14 horas de viagem, finalmente, pisamos em solo brasileiro. Que sensação boa voltar para casa, para nosso país, nossa cultura, nossa língua, ainda mais depois de vinte e um dias em solo estrangeiro. Mas chegando no aeroporto fomos recebidos com um balde de água fria da realidade brasileira. Confesso que por um momento – muito rápido, mesmo - senti vontade de pegar as malas e voltar para a nação de onde acabava de chegar. Talvez você esteja se perguntando: o que aconteceu de tão grave? Vamos lá!

Filas desorganizadas. Até aí tudo bem. Estávamos em um grupo e com bastante bagagem para despachar. Mal entramos na fila, que não estava pequena, e fomos abordados por um homem uniformizado, aparentando ser funcionário do aeroporto:

- Vocês não precisam enfrentar essa fila. É só me acompanhar e poderão despachar direto.
- Como funciona isso? – perguntamos.
- É só me dar uma gorjeta e fica tudo certo. Nada de espera!
- Nós recusamos a oferta.

Ah! O “jeitinho brasileiro”... Desse traço da nossa cultura - se é que posso considerar dessa maneira - não senti saudades. Aliás, a Lei de Gérson, essa mania de “querer levar vantagem em tudo” está tão impregnada no nosso dia a dia que, muitas vezes, isso é encarado como algo normal, natural, afinal, que mal há em:

*Guardar lugar no teatro para nossos amigos que vão chegar em cima da hora ou atrasados. Quem se programou, chegou antecipadamente, que fique nos últimos assentos, afinal estamos guardando lugar para os NOSSOS amigos que são muito mais especiais. Isso não é tão grave, é? Se pensarmos que pessoas se programaram para chegar mais cedo e pegar um bom lugar e poderão sair prejudicadas, é algo a se pensar.

*Receber troco a mais na padaria e ficar com ele, afinal o erro não é MEU. Está tudo muito caro mesmo. Uns trocados não vão fazer falta para o comerciante.

*Conseguir um atestado médico... “Puxa! Gostaria de ir ao estádio assistir ao jogo do meu time do coração na capital. Como justificar no trabalho uma viagem para tal finalidade? Ah! É só pedir um atestado para aquele MEU amigo que é médico”.

*Assinar a TV a cabo e, conforme o vendedor ofereceu extraoficialmente, compartilhar o sinal com mais cinco usuários, pagando apenas por um ponto. Os MEUS familiares sairão no lucro. Como diz o ditado popular, o mundo é dos espertos.

*Sonegar...Para que pagar imposto? Além de o valor ser exorbitante, o dinheiro vai para o bolso dos políticos corruptos.

*Quanto MEUS colegas deputados e EU vamos receber para aprovar a lei que trará vantagens para a sua empresa?

Haja jeitinho... Sinta-se à vontade para acrescentar mais situações nessa lista.

Deixando a ironia de lado...

Se fizermos uma enquete com cidadãos comuns sobre o que eles acham do cenário político, ou de nossas lideranças e dos órgãos públicos, muito provavelmente, os entrevistados vão dizer:

-Os políticos são a vergonha nacional.
-Os corruptos merecem cadeia.

A diferença entre um “pequeno” ato de corrupção e um “grande” ato de corrupção pode estar nas consequências que trazem, mas na essência são exatamente iguais.

Vale a pena a reflexão sobre a nossa própria conduta. Vemos “Gérson” (o que dá nome à lei) refletido no espelho?

Enquanto apontamos um dedo para alguém, há três dedos voltados para nós. Se queremos uma sociedade melhor, não adianta apenas denunciar os erros (isso é importante), mas é necessário avaliar nossa conduta e colocar em prática princípios e valores.

A nação é formada por cada um de nós. Se queremos alguma mudança temos que nos dispor a ser o ponto de partida. Não podemos nos deixar controlar pela “Lei de Gérson”, mesmo que isso signifique nadar contra a correnteza. Afinal não temos que nos deixar moldar pelo senso comum, quando na verdade de “senso” e de “comum”, muitas vezes, não tem nada. Estejamos alertas!

Jesus nos deixou dois mandamentos: Ame o Senhor, o seu Deus de todo o seu coração, de toda a sua alma e de todo o seu entendimento. Este é o primeiro e maior mandamento. E o segundo é semelhante a ele: Ame o seu próximo como a si mesmo (Mateus 22.37-39 - NTLH).

Creio que a lei do amor de Deus, sim, pode fazer diferença e promover o bem a todos, a partir de cada um que a pratique.